Sobre um tuíte do assessor
Oderint dum metuant é uma frase de Cícero, que citava por sua vez um poeta chamado Lucius Attius (há quem diga que é de autoria de Calígula) e significa Que me odeiem, contanto que me temam. Esta culta citação foi feita num tuíte de Filipe Martins, assessor da Presidência da República.
Até ai tudo bem, ou quase, já que este conceito, desenvolvido mais tarde por Maquiavel, não é exatamente o de um governo preocupado com o bem estar de todos. Mas vá lá, pode estar se referindo a malfeitores, e é isto que Felipe certamente alegará. A porca torce o rabo quando se descobre que a frase serviu de lema para um grupo neonazista chamado Combat18.
Este tuíte do assessor que é um dos discípulos preferidos de Olavo de Carvalho serve para entendermos duas estratégias fascistas de comunicação muito usadas e eficazes: a contaminação de símbolos e o apito para cachorros.
A contaminação consiste em tomar algo de uso comum e determinar que seja símbolo seu. Serve para coisas comuns como beber um copo de leite.. Ou a camisa da seleção. Ou uma citação latina. Em todos os casos, a desvirtuação do significado e apropriação do símbolo gera confusão aos adversários, como no caso do americano que teve a vida destruída por estalar os dedos e ter o gesto confundido com o sinal de ok, que virou sinal supremacista… cada vez que o fascismo faz isto, amplia seu campo semântico acuando os inimigos e naturalizando seu pensamento.
Já o apito para cães consiste é ligado ao outro, e consiste em manter sempre a ambiguidade dos símbolos adotados, de modo a ter uma alegação de inocência em seu uso, mas ao mesmo tempo manter uma comunicação direta com os fanáticos, e para manter a coesão deste grupo os símbolos exclusivos são fundamentais para dar a eles a noção de um privilégio no entendimento. Saber o que “realmente” significa um aperto de mão ou uma cartão citação latina dá uma enorme sensação de pertencimento, desde os maçons.
Ou seja, o uso dos símbolos deturpados pelo fascismo serve para mandar mensagens de ódio para seu grupo de apoio (o som que só os cachorros escutam) mantendo sempre um álibi semiótico para os demais. É só um copo de leite, é só uma frase de a Cícero. E vocês que me acusam são paranóicos, desonestos, ou ambos.
Filipe é um dos que manipulam estes códigos de comunicação fascista, um dos coordenadores internos da ideologia de destruição deste governo. A contaminação de símbolos é algo com que ainda não aprendemos a lidar, e a desfaçatez dos apitos para cães tem mantido unida a base mais feroz do fascismo. Este sistema de significação precisa ser desmontado tanto quanto as redes de fake news para que o fascismo seja derrotado.