Sobre pavões sem mistério
Merece atenção o ataque sofrido pelo Intercept no domingo. Não por ter um pingo de verdade, mas pelo método utilizado. O que aconteceu diz mais sobre os seus autores que sobre seus alvos — em forma e conteúdo.
Em conteúdo, porque é uma barafunda dos diabos. Uma bagunça propositalmente incompreensível envolvendo uma espécie de intriga Internacional digna de 007. Um hacker russo, o fundador do EBay, os Panamá Papers, bitcoins, Ethereum e Jean Wyllys, todos juntos, misturados e shallow now numa conspiração mundial contra a Lava Jato.
A história é sem pé nem cabeça, mas incrivelmente esta é sua vantagem: ela é complicada como as explicações filosóficas de Olavo de Carvalho, e, um pouco como a roupa nova do imperador, quem a finge entender se sente mais esperto. E também porque ela não é feita para convencer neófitos, mas para manter ocupados os memerizados. Não precisa fazer sentido, precisa ser replicada em massa, e será.
E a mesma linha seguem os documentos que pretensamente preenchem os buracos da teoria mas são tão furados quanto ela, com palavras e quantias erradas. Outra vez importa pouco que não resistam a uma segunda olhada, seu público não olhará detidamente nem a primeira vez.
E então chegamos à forma, que esta sim importa. O meio de difusão das acusações mereceu muito mais atenção e planejamento que elas próprias, e se deu numa ordem claramente premeditada. Primeiro passo, a conta do Pavão, auto-intitulado hacker do hacker, no Twitter, criada para publicar as acusações e apagada em seguida.
Mas peraí, se a conta era nova como conseguiu tamanha repercussão? Ora, porque tudo o que ela fez foi dar a deixa para o site Terça Livre. Este é o site que atuou na calúnia e difamação à jornalista que investigou o esquema de fake news da campanha de Bolsonaro. Trata-se basicamente de um braço armado da mídia do Planalto, a mando do assessor da Presidência Filipe Martins — por sinal olavista de carteirinha.
Pois bem, assim que o Pavão deu a partida na operação, uma série de ações encadeadas começou, notadamente a publicação pronta de todo o conteúdo no Terça Livre, fixando
o material para reprodução e dando-lhe um aspecto mais respeitável que num suíte. Simultaneamente, os robôs da comunicação fascista dispararam à toda replicando o Terça Livre e levantando a hashtag previamente decidida Show do Pavão. A rapidez com que tudo isto aconteceu evidência a orquestração. Era preciso fazer muito barulho antes que contestação tivesse tempo de ser feita, e assim isolar informativamente os seus seguidores.
A estratégia de resistência do governo é, diante da queda progressiva de sua aprovação e das sucessivas denúncias, investir cada vez mais nos hipnotizados, em seu núcleo duro de seguidores, apostando que estes serão suficientes para sustentá-lo. Está progressivamente se entrincheirado. A ação contra Glenn, por mais agressivo que tenha sido,, foi na verdade uma ação defensiva, de quem está acuado. Dia única saída é blindar seus fiéis e ir perdendo alguns a cada bordoada. Está desde já adiando sua derrocada o quanto pode. Mas como disse um sábio presidente, o tempo é o senhor da razão.