Sobre os públicos do bolsonarismo

Túlio Ceci Villaça
4 min readSep 14, 2019

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Enxergo daqui quatro públicos principais que dão sustentação ao regime fascista. Públicos muito diferentes entre si, com algumas intersecções, e entre os quais Bolsonaro se equilibra. Mas são os públicos nos quais ele aposta para impedirem sua queda. São eles:

1- Fashwavers. Este grupo é a base do apoio digital do fascismo, sua milícia na internet. Há um pouco de muitas tribos nele: gamers (que Bolsonaro vive afagando), incels, hackers, mascus, neonazis, nerds… o fato de nessa lista haver grupos inofensivos é seu grande trunfo, pois é onde se dá parte do recrutamento. Seus pontos de encontro são chats anônimos como o 4cham e na deep web. Grande parte dos ataques e ameaças na internet, como invasões de perfis e grupos, as ameaças que levaram Jean Wyllys a sair do país e dispersão de fake news são trancadas por aqui, com a participação de assessores de comunicação do governo que têm ligações com estes grupos. É um grupo minúsculo e barulhento, que apoia Bolsonaro por convicção fascista. Boa parte é criminosa digital e deveria estar preso, mas é protegida por uma Polícia Federal aparelhada via Sergio Moro.

2 — Olavistas. É um grupo com características muito diversas, mas igualmente fechado. Formado principalmente por aspirantes a intelectual, capturados pelo caminho alternativo à academia oferecido pelo guia, ou de aproveitadores inteligentes que percebem um filão de poder a ser explorado, desde que sem entrar em choque com o líder. São medievalista, supervalorizando autores conservadores radicais esquecidos e construindo a partir deles teorias de conspiração completas, detestando a ciência constituída. Têm uma intersecção grande com mega conservadores católicos, que apoiam Bolsonaro por uma restauração dos costumes e contra identitários em geral, sendo eles próprios identitários brancos, católicos etc. Afirma-se perseguido pelas minorias e pratica a inversão de sentido o tempo todo — racismo reverso, por exemplo. São igualmente um grupo pequeno, mas bastante poderoso por suas conexões. Por isso, estão muito representados no governo e o influenciam fortemente. Porém, apoiam Bolsonaro por orientação externa, e o líder faz questão de se manter distanciado do governo que ajudou a eleger, de forma a não se queimar com sua eventual queda. Caso o barco aderne, este grupo pode mudar de lado rapidamente e ajudar a empurrar para baixo.

3- Neoliberais. Abrigo sob este nome também outros mais radicais como os anarcocapitalistas, neomalthusianos e darwinistas econômicos (!) Vão desde os que consideram que o governo Bolsonaro é um mal necessário para todas as medidas que acabem com o perigo comunista até os que acham que a missão de Bolsonaro é destruir o Estado, o que eles almejam, e que nome sociedade ideal a meritocracia seleciona os mais aptos, e o restante que se dane. Em todos os casos, viceja um cinismo amoral, seja aceitando os crimes do governo em nome de um pretenso bem maior,, seja apoiando-os entusiasticamente em nome da mesma coisa. Destes, os que têm um mínimo a perder (ou seja, não são meros teóricos) estado abandonando o barco, pré perceberam que este governo não é liberal, é apenas demente. Dificilmente Bolsonaro manterá o apoio deste grupo a médio prazo.

4- Minions. O mais próximo do homem comum, e o único grupo representativo em quantidade, o que determinou com seu voto a Vitória de Bolsonaro. Está sujeito às influências indiretas dos três grupos acima, muitas vezes sem ter consciência disto, e também da mídia oficial parceira do governo fascista e das igrejas evangélicas — os neopentecostais são um subgrupo importante deles, mas mesmo os não evangélicos são infiltrados pelos valores emanados deles. Bolsonaro investe muito neste grupo tentando manter dele um núcleo duro significativo. Afinal, ter chamado o dono da Record e o dono do STB para assistirem com ele o desfile de 7 de setembro é parte do acordo que já se conhece desse a campanha com estas duas redes de comunicação. Porém, este é o grupo mais difícil de manter fiel, por ser muito grande, heterogêneo e com muito pouca ideologização. Grande parte dele votou em Bolsonaro por empolgação, a típica onda publicitária, e uma parcela crescente está debandando ao passar a hipnose e confrontar a realidade da economia ruim e os desmandos de um governo em ziguezague. A exceção são os evangélicos, mantidos pela ordem unida dos pastores, mas mesmo entre estes há perdas, e, assim como nós olavistas, se o barco fizer água o Edir pula fora, já fez isso com Dilma. É onde Bolsonaro está derretendo, e vai derreter mais.

Aglutinei nesta lista subgrupos que mereceriam estudos à parte, em nome de encontrar pontos em comum entre eles. O objetivo é tanto entender o processo de conquista e manutenção de apoios que explica muitas das ações aparentemente disparatadas do governo, que na verdade quer agradar algum destes grupos minoritários mas importantes para sua sustentação, quanto detectar seus pontos fracos, onde seus interesses podem ser contrariados, e onde seus planos podem ser interrompidos. Para que o fascismo seja detido, os líderes destes grupos precisam ser contrariados. O próprio governo, em sua insanidade, já está fazendo à sua parte e se entrincheirado cada vez mais. Façamos à nossa.

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Túlio Ceci Villaça
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