Sobre as duas forças fascistas

Há duas forças opostas agindo hoje no Brasil, e ambas são movimentadas pelo fascismo. São as duas que realmente importam.

Uma é a força de destruição do país e de saque generalizado. É o corte quase total da verba científica, é a cooptação e destruição das instituições por dentro, é a carta branca para o desmatamento, a grilagem e os assassinatos de índios e sem terra, é o descrédito da pesquisa médica que levou centenas de milhares à morte, é o desgoverno econômico absoluto que está gerando a inflação e a fome. Isso tudo vai piorar, e as consequências disto tudo tendem a fazer as pessoas terem repulsa pelos que estão no poder, quando as sofrem.

Mas a outra é a força de criação da realidade paralela, onde nada disso é real ou importa. É a força dos meios de comunicação cooptados, comprados ou subterrâneos, dos canais de TV e Rádio cúmplices do genocídio, dos canais de YouTube subvencionados por verbas de publicidade, dos canais de Telegram sem nenhum tipo de regulação e dispostos a estabelecer que o grande líder sabe exatamente o que está fazendo, e que tudo que acontece de errado é culpa de seus inimigos. Esta força tende a fazer com que os capturados por ela seja praticamente imunes à anterior.

E o que acontece hoje é que a oposição ao fascismo está confiante que esta primeira força vai ser suficiente para derrubar o fascismo, ou seja, que ele vai cair de maduro. E já está se digladiando entre si para ver quem vai ocupar o seu lugar, desconsiderando que foi esta segunda força que levou o fascismo ao poder; que ela não foi debelada, ao contrário, está se reconstituindo como uma Medusa à qual se cortaram meia dúzia de cobras-cabelo, mas cuja cabeça permanece no mesmo lugar; e que ela tem efetivamente o poder de anular a primeira na mente das pessoas, porque o ser humano é capaz de tudo, inclusive de se alhear completamente à realidade.

Em suma: eu acredito firmemente que este governo não vai fazer nada que conte a seu favor e a vida só vai piorar. E acho que algumas das forças políticas que se opõem a ele estão achando que vão ganhar paradas, ou pior, que já está tão ganho que podem queimar pontes com possíveis aliados, porque não se trataria mais de se vamos ganhar, mas quem vai ganhar. E eu acho, realmente, que estão contando com o ovo dentro da galinha. Todos os componentes mais importantes para decidir quem vencerá daqui a um ano estão na mão do fascismo, e nenhum na mão de sua oposição, e estão achando isso uma situação confortável.

Da minha parte, faço questão de todo o meu esforço político estar voltado contra o fascismo, e me recuso terminantemente a entrar em brigas no meu próprio campo. E, como profissional de comunicação, vou continuar alertando (foi mal a chatice) para o perigo que corremos com a reestruturação crescente da força de propaganda fascista. Já perdemos uma vez, vendo serem eleitas pessoas que sequer sabíamos que existiam, e os resultados estão à nossa volta, com o país desmoronando. Mas da primeira vez fomos pegos de surpresa. Se isto acontecer de novo, a destruição do país agora será em grande parte nossa culpa, que passamos o tempo desmascarando nossos aliados possíveis enquanto os inimigos fazem seu trabalho.