Sobre a volta do Império da Lei

Túlio Ceci Villaça
3 min readNov 2, 2022

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As reações fascistas à eleição do Lula são de uma minoria barulhenta que provavelmente está fazendo com que muitos dos seus eleitores se arrependam. Ainda assim, é gente demais cometendo e defendendo crimes. E com o apoio discreto ou ostensivo de empresários, que alimentam o locaute dos caminhoneiros e fornecem até banheiros químicos para as barricadas, e de integrantes de PM, PRF e mesmo exército, que têm se juntado a manifestantes, demonstrado apoio e mesmo ajudado, como o caminhão do exército que forneceu gentilmente pneus para serem queimados.

Isto é preocupante não por sua efetividade imediata, que é praticamente nenhuma — a imensa maioria da população, que há alguns anos acumulou estoques de papel higiênico, hoje não está dando a mínima para os bloqueios, a não ser quando diretamente prejudicada, e parte dela já está perdendo a paciência inclusive. Mas a parcela da população fascistizada é um problema para o país ali adiante, e os que estão alimentando a ilusão deles ainda mais.

E aí o país terá pela frente a questão da punição a uns e a reconquista de outros, e a difícil decisão de qual solução aplicar a cada caso. É o velho dilema, sua tia que defende intervenção militar é uma iludida que merece pena ou uma criminosa que precisa ser presa? Em alguns casos é evidente, em outros não, porque nem sempre é a velha tia, às vezes é aquele primo ou cunhado que sempre andou em negócios suspeitos, ou o tio militar reformado.

Quando uma pequena multidão vai ao delírio com a notícia falsa da prisão de um ministro do STF, quem ali deve ser preso? Quando uma pequena multidão faz a saudação nazista ao hino nacional, quantos devem ser presos? Quando caminhoneiros bloqueiam a estrada, quantos e quais devem ser presos? Todos? Só os líderes (que eles dizem que não têm, mas têm)? Os financiadores? Quem os defendeu nas redes sociais? Destes últimos, só os que têm cargo público? Ou também influencers? Como deve ser a punição dos policiais que se cumpliciaram? Expulsão? Prisão?

São decisões difíceis que terão de ser tomadas, pois envolvem muita gente, corporações e devem ter como objetivo pacificar o país, não atiçar o fogo. O certo é que não poderá deixar de haver punição simplesmente porque crimes não podem ficar impunes. Mas determinar a real responsabilidade de quem participou e seguir o devido trâmite legal são pressupostos indispensáveis, com uma fundamentação jurídica sólida que não permita questionamentos (que serão feitos mesmo assim, porque é o que fascistas fazem).

É preciso traçar uma linha no chão com firmeza, mas o lugar onde esta linha deve ser traçada é o que precisa ser decidido com o maior cuidado. Os fascistas certamente acusarão uma caça às bruxas, porque é o que eles fazem, acusam os outros do que gostariam de fazer. Por isso mesmo é preciso que não haja nem sombra disso. Quem está atentando contra a democracia deve responder por seus atos, e quem está achando bom precisa saber que a justiça agirá contra quem o fizer. Este é o primeiro passo na defascistização do país, a volta do Império da Lei. Sem o menor revanchismo, apenas justiça.

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Túlio Ceci Villaça
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