Sobre a Karol Eller
Há uns 15 anos, Karol Eller era uma brasileira que pensava em emigrar para os EUA para trabalhar como babá ou faxineira. Começou a estudar o assunto, achou que o liberalismo, o sonho americano e a meritocracia eram coisas legais. Acabou não emigrando, mas ficou com essas ideias na cabeça.
Aos poucos, foi se aproximando do universo neoconservador que surgia no país. Começou a fazer vídeos repetindo o que ia aprendendo e virou uma influenciadora. Ao mesmo tempo, Bolsonaro se tornou o ícone dessa gente, e ela se tornou bolsonarista.
A esta altura, já estava radicalizada e fanatizada, espalhando as mentiras que lhe passavam. Ganhou um cargo na EBC durante o mandato do Bolsonaro. Quando ele saiu, tornou-se assessora de um deputado federal. Tirava fotos com os Bolsonaro, com Damares, com Magno Malta. Parecia ter tido sucesso sem precisar ir para os EUA. Só tinha um problema: era homossexual.
A Karol dizia que o Bolsonaro não era homofóbico. Mas ela não conseguiu conviver com a própria condição. Este ano se tornou neopentecostal. Em setembro anunciou que estava iniciando um tratamento de cura gay. Esta semana postou em suas redes sociais que havia “perdido a guerra” e se atirou do quinto andar.
A história da Karol deveria servir de lição a quem a levou ao suicídio. Mas não vai. Magno Malta lamentou sua morte dizendo que “Deus estava preparando um varão para ela”. Michele Bolsonaro atribuiu sua morte aos pecados cometidos antes em sua “vida de abusos”. Para eles, ela é uma perdedora, bola pra frente.
Mas para nós, que não queremos ser assim, a história da Karol pode e deve servir de lição. Deve nos lembrar que os capturados pelo fascismo são seres humanos. Sim, há muitos aproveitadores absolutamente desonestos. Sim, há os dispostos a tudo para defender os próprios privilégios. Mas o que leva ao fascismo é, muitas e muitas vezes, um ódio furioso contra si próprio e uma fragilidade psicológica gigantesca. Por trás da máscara de arrogância típica dos fascistas, em geral a insegurança é imensa, e justamente por isso tão disfarçada.
A Karol tinha uma necessidade desesperada de aceitação. Ao pensar em emigrar 15 anos atrás, devia se achar um fracasso por aqui, preferindo ser cucaracha lá. Quando conseguiu popularidade repetindo a ladainha neoliberal, sentiu que gostavam dela. O reforço positivo a levou a radicalizar cada vez mais, mas não deu conta da homossexualidade. O golpe final para ser completamente aceita foi tentar se violentar. O ódio a si mesma foi mais forte.
Tem muita gente odienta no fascismo, que aderiu alegremente. Mas mesmo esses têm pontos fracos que os levaram até ele, frequentemente se sentirem fracassados, e então culparem todos em volta, menos a si mesmos. Quando eu olho para o sorriso sarcástico de um Fernando Holiday, ou mesmo de um Sérgio Camargo, eu só consigo enxergar pobres coitados que se tornaram cachorrinhos daqueles que os odeiam. Não que não devam ser responsabilizados pelo que fazem. Mas o auto-ódio deles é tão evidente que mal consigo imaginar o esforço diário que eles fazem para não enxergarem isso.
Eu, como espírita que sou, realmente torço para que a Karol esteja recebendo toda a ajuda possível do outro lado neste momento, e que possa o mais cedo possível perceber o buraco em que se meteu e começar a trilhar a direção contrária. E a quem se deu o trabalho de ler até aqui, peço que tenhamos, tanto quanto pudermos, aquilo que deve nos diferenciar dessas pessoas. Elas já têm ódio tanto por nós quanto por elas próprias. A nós cabe ter compaixão.